A fotografia dos corações esquálidos
Entendo que o dia talvez comece uma
tremenda
porcaria para muita gente acima do
nível do mar
e que as brisas parem, às vezes, de
soprar a desesperança
para longe dos vícios e dos olhos
cheios
de remela
de um cansaço infindo
mas talvez
(um milésimo de talvez do tamanho de
um grão de areia)
seja assim porque as cores do
arco-íris já ficaram
desbotadas, ressequidas, cobertas de
chagas humanas
e ninguém se apercebeu desse detalhe
até
agora
e
agora
você olha pro final da chuva
agora
você
decide encarar o sol de frente,
nariz para o alto
sugando o que puder aguentar nos
pulmões:
cheiro de terra, de barro, carbono decomposto,
corpo vivo
essa substância que deveria invadir
sempre
pelos poros
atacar o cerne impetuosamente
devastar o vazio inteiramente
até exterminar nosso último enredo
de destroços íntimos.
Mas talvez
(um pequeno, raquítico talvez atrás
dos móveis)
não seja o bastante e
por mais que se regue e
por mais que se dance e
lhe ofereça a palavra certa
apenas talvez
esse arco-íris permaneça numa
fotografia de corações esquálidos.
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